A Altice Portugal vai suspender projectos de investimento, “em consequência do desastre das decisões do regulador” sobre o 5G, que “até agora não foram contrariadas pelo Governo”, disse à Lusa o administrador João Zúquete da Silva.
As declarações da administradora do dono do Meo vêm no seguimento de uma reunião do grupo Altice Portugal, em Lisboa, sobre a posição da empresa relativamente às regras do leilão de quinta geração (5G).
“O regulamento do leilão 5G é uma falácia”, foi “elaborado para que a Anacom [Autoridade Nacional de Comunicações] pode cumprir um conjunto de indicadores estatísticos, que de forma alguma servem o povo, a economia, o país ”, disse João Zúquete da Silva, que também é chefe de delegação da Altice Portugal nas audições com grupos parlamentares na Assembleia do a República.
O gestor, que criticou o regulamento, disse que perante “esta realidade indesejável”, para além dos “mecanismos e acções de natureza jurídica e contenciosa já anunciados”, a Altice Portugal não tem alternativa senão “repensar” a visão estratégica para Portugal , “envidando todos os esforços para buscar a sustentabilidade financeira e a proteção do emprego”.
Neste sentido, “somos assim obrigados a tomar medidas imediatas que incluem a suspensão dos projectos de investimento em curso, a cessação do estabelecimento de novas parcerias, a não operacionalização das actuais parcerias no território, com especial enfoque nos projectos em áreas com menor densidade populacional. ”, continuou João Zúquete da Silva.
Inclui ainda o “congelamento do programa de descentralização da inovação da Altice Labs – que por sua vez necessita de ser reavaliado no âmbito da sua actividade em Portugal – e também a suspensão da maior parte dos programas de responsabilidade e apoio social, bem como o abrandamento significativo da expansão da fibra ótica e rede móvel “, acrescentou.
“Tudo isto, em consequência do desastre das decisões do regulador que, até agora, não foram contrariadas pelo Governo”, frisou o administrador do dono do Meo.
“O país, nomeadamente os autarcas, tem visto os esforços da Altice Portugal na valorização dos seus territórios e em parcerias que têm sido muito importantes na resolução de problemas em diferentes concelhos”, disse.
“Infelizmente, e face a este violento ataque ao sector, não temos alternativa senão suspender praticamente todos os investimentos que até agora têm ocorrido em território português, com uma clara perda para os nossos clientes, para o mercado, para o economia e para a sociedade ”, frisou o gerente.
“Tal como foi concebido, este regulamento empurra o país para um ‘5Gzinho’, para um 5G administrativo e sem ambição, porque as operadoras estarão apenas focadas no cumprimento das obrigações mínimas e não no desenvolvimento do 5G” e “tudo isto baseado em um conjunto de pressupostos e crenças da Anacom sem qualquer suporte técnico, estudo ou evidência, efectuado internamente pelo próprio regulador ou por entidades externas independentes e credíveis ”, criticou João Zúquete da Silva.
Também contestou o ‘roaming’ nacional, considerando que o “papel das três operadoras móveis, que há várias décadas investem no setor na economia, será apenas uma rede ‘Uber’ para estes novos entrantes, que funcionam como parasitas operadores de investimento consolidados de quem já está estabelecido em Portugal ”.
João Zúquete da Silva esclareceu que, “ao contrário do que é informado pelo regulador, o roaming nacional na Europa só existe, na realidade, em três países, de forma imposta”.
E num deles, o roaming nacional “vai acabar em 2022 por não ter resultado, e nos outros dois países só se deve a obrigações de processos de fusão”, detalhou.
Em outros países europeus, “o que nosso regulador chama de roaming nacional” nada mais é do que acordos de alcance limitado entre operadoras “, disse o gerente.
“Outro pressuposto continuado da atuação do regulador é a suposta ausência de concorrência em Portugal, utilizada apenas para justificar os benefícios aos novos entrantes”, frisou, destacando “que a maior prova de concorrência no mercado das telecomunicações em Portugal é a liderança que O Meo assumiu a televisão paga, apenas 12 anos depois de ter sido lançado no mercado sem clientes naquele serviço ”.
A pandemia covid-19, continuou ele, “obrigou as operadoras a reforçar e investir na capacidade de rede, resiliência e segurança, para garantir que todas as famílias e empresas continuem a trabalhar”, com as telecomunicações se tornando um ativo essencial e um “fator-chave” em conectividade entre pessoas e empresas, disse ele.
“Diante desta nova realidade, era imprescindível que houvesse bom senso e equilíbrio na regulação do 5G, só assim seriam atendidas as verdadeiras necessidades do país. Porém, não há medida que permita verdadeiramente universalização do acesso às redes de banda larga .móvel, sendo que nesta matéria têm sido os operadores do sector das comunicações em Portugal a fazer os investimentos necessários para o efeito ”, defendeu.
Sobre a importância da capilaridade de cobertura, o administrador considerou que o regulador e o Estado “na prática nada fizeram para responder a este desenho”.
João Zúquete da Silva salienta que “a verdade é que 10 anos após o lançamento do 4G em Portugal, e embora a cobertura desta rede seja superior a 99,45% da população portuguesa, cerca de um terço dos portugueses não tem acesso a esta tecnologia por não ter um ‘smartphone’ “.
Ora, “esta situação ocorre nas regiões com menor densidade populacional do interior do país e foi uma dessas regiões que foi escolhida pelo regulador para a primeira fase das obrigações de cobertura 5G”, sublinhou.
Na semana passada, o ministro da Economia disse estar “preocupado” com “tanta polêmica” em torno do regulamento do leilão 5G, observando que a cobertura do território por “boa infraestrutura de telecomunicações” tem sido um fator de atração de investimentos.
A Anacom divulgou o regulamento na semana passada, o que gerou fortes críticas das três operadoras de telecomunicações.