“Eu não aguento mais chorar!”

De uma máscara branca sobre a boca e o nariz, Mônica Cunha – uma educadora negra de 54 anos – gritou em frente ao Palácio da Guanabara, sede do governo no Rio de Janeiro: “O Estado não pode matar. O Estado não pode pensar que somos descartáveis. Não somos “Nós somos humanos! O Estado não pode mastigar e nos expulsar.” Ao seu redor, vinte ou trinta pessoas incentivavam aplausos improvisados ​​e gritos de discurso improvisado, que se tornavam cada vez mais acentuados. “Temos que ir às ruas! Não podemos ficar em casa a pedido da Organização Mundial da Saúde e do governador. Você sabe por quê? Porque o estado continua nos matando, mesmo em uma pandemia de coronavírus. A vida dos meus filhos, a vida do meu povo são importantes!” Estou chorando! “

O manifestante fundou o Movimento Moleque em 2003 e está no comando desde então. As lutas coletivas pelos direitos dos jovens infratores. Na tarde de domingo, enquanto protestava, a ativista cobriu o rosto com uma viseira transparente e usava uma camiseta folgada com a foto de um garoto sorridente. Foi Rafael, o segundo de seus três filhos. Na adolescência, ele tentou roubar um carro e, por isso, conheceu medidas sociais e educacionais por quase nove meses. Mais tarde, ele se envolveu no comércio de drogas. Terminou com o assassinato de policiais civis em dezembro de 2006, entre as favelas de Rato Molhad e Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro. Testemunhas disseram que ela atirou no rapaz com uma espingarda no estômago, quando ele já havia se rendido, de joelhos. Ele tinha 20 anos.

“Ou terminamos agora, ou você será como eu amanhã”, continuou o educador, apontando para uma negra muito mais jovem que a observava. “É inaceitável! Meu povo tem que continuar vivendo. Os negros vivem! Os jovens negros vivem! As mulheres negras vivem!” Concluiu Mônica, que não usava megafone ou alto-falantes. Ela gritou em voz baixa, assim como todos os que falavam lá.

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Eem carros ou plataformas sonoras, a manifestação não tinha liderança. Centenas de pessoas – duzentos, trezentos, quatrocentos? – que decidiram romper o isolamento social e se juntaram às 15h em frente ao palácio, no bairro das Laranjeiras, dividido em vários grupos. Cada um deles formava um fragmento autônomo, sobre o qual alguém falava ou levantava slogans, facilmente repetidos pelos que os cercavam. Apenas alguns minutos se passaram entre o nascimento e a dispersão deste ou daquele grupo.

Um aspecto não insignificante garantiu a unidade dos protestos: a raiva dos manifestantes contra os excessos cometidos pela polícia do Rio, que frequentemente culminam no assassinato de negros. Esse tipo de violência – que os ativistas chamam de “genocídio” – tem um ano e alimentou todos os tipos de queixas. Seis eventos recentes, no entanto, serviram de gatilho para a ação de domingo:

* Policiais militares e civis foram ao Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, no dia 15 de maio, atrás de drogas, munições e armas. Os moradores relatam testemunhar ou ouvir tiroteios intensos. A operação resultou em doze mortes. Apenas um policial ficou ferido, sem ferimentos graves.

* Em 18 de maio, o adolescente negro João Pedro Mattos Pinto (14) morreu após um tiro na cabeça de um rifle. Ele estava brincando com seus parentes na casa de seu tio em São Gonçal, no município do Grande Rio, quando policiais federais e civis invadiram a propriedade em busca de traficantes de drogas.

* Também em 18 de maio, parentes de Iago César dos Reis Gonzaga disseram que a polícia militar torturou e matou um negro de 21 anos durante uma operação na Favela de Acari (Zona Norte do Rio). O primeiro-ministro não comentou a ação.

* Em 20 de maio, uma troca de tiros entre criminosos e a Polícia Militar na Cidade de Deus (Zona Oeste) interrompeu a distribuição de duzentas cestas básicas por voluntários locais. A batalha causou a morte João Vitor Gomes da Rocha, 18 anos, preto. Segundo o primeiro-ministro, o garoto fazia parte de uma gangue realizando seqüestros com raios. Sua mãe, trabalhadora doméstica, nega a versão do governo.

* Em 21 de maio, enquanto patrulhavam o Morro da Providência (Centro), a polícia militar entrou em conflito com bandidos. O tiroteio – que dificultou outra doação de cestas básicas, desta vez promovida pelos estudantes antes do vestibular da universidade – causou a morte de Rodrigo Cerqueira da Conceição. A polícia diz que o menino preto de 19 anos carregava uma arma e uma revista, além de narcóticos. Testemunhas, no entanto, afirmam que o jovem estava trabalhando quando o conflito eclodiu.

* Em 30 de maio, Matheus Henrique da Silva Oliveira – um barbeiro preto de 23 anos – foi baleado duas vezes e morto enquanto andava de moto perto do Morro do Borel (Zona Norte). Os vizinhos do jovem dizem que os primeiros-ministros dispararam tiros. O caso ainda está sendo investigado.

Seis episódios de maio seguiram um mês particularmente sangrento. Em abril, 177 casos morreram no estado do Rio devido a intervenção policial. O número anunciado pelo próprio governo é 43% maior que em abril do ano passado.

Çcanudos de oliva e ativistas negros se voltaram para as mídias sociais para pedir manifestações. No sábado, Raul Santiago – um ativista alemão – já havia divulgado mensagens em português, espanhol e inglês sobre o protesto no Instagram. “Infelizmente”, lamentou um deles, “a polícia insiste em matar nosso povo durante uma pandemia. Se não morrermos pelo vírus, seremos mortos pela violência policial”.

Na manhã de domingo, a agência de notícias Alma Preta Jornalismo informou que a ação foi organizada “espontaneamente” pela internet. Duas fotos ilustram a nota: a dos garotos Joe Pedro e George Floyd, um negro desempregado morto pelo policial branco Derek Chauvin por asfixia em Minnesota há uma semana. O assassinato provocou uma onda de revoltas populares nos Estados Unidos, que agora inspiraram os brasileiros.

À tarde, em frente ao Palácio da Guanabara, Raull Santiago profetizou: “Este não é apenas um ato. Este não é o único ato. Este não é o último ato. Este é apenas o começo!” Os aplausos e gritos dos “balanços” comemoravam o sinal.

Mensagens digitais anunciando a reunião pediram aos manifestantes que não desistissem dos cuidados de saúde. “Coloque a máscara.” “Leve álcool gel na mochila ou no bolso.” “Fique a dois metros de outras pessoas.” “Voltar para casa logo após o protesto.”

Quase todos os presentes tentaram seguir as regras. Muitos não usavam máscaras como viseiras, óculos de segurança e luvas. Eles limpavam as mãos regularmente. O problema estava mantendo distância. Muitas vezes estava lotado aqui ou ali. “Olhe para o espaço!” Alguém gritou. Os grupos então estenderam os braços em uma cruz e tentaram se distanciar um do outro. A estratégia, no entanto, funcionou apenas por alguns segundos.

Bandeiras do partido eram pouco visíveis entre os ativistas. Por outro lado, cartazes e pôsteres improvisados ​​foram espalhados, geralmente manuscritos: “A periferia está gritando!”; “A dor das mães de crianças assassinadas não tem preço”; “Pare de nos matar”; “Vidas negras e palhas são importantes”; “Meu grupo de risco é diferente.”

Na mesma linha, gritos e gritos se seguiram: “Não há medidas contra o genocídio dos negros!”; “Fascistas! Racistas! Isso não vai funcionar! “; “Chega de matança, polícia mortal!”; “Os negros são unidos fortes negros, que não têm medo de lutar, que não têm medo da morte”; “Acorde, classe média!”; “Não acabou, tem que acabar! Quero que a Polícia Militar pare!” ou “Milícia Deus!” O governador Wilson Witzel também mereceu algumas “mordidas”: “Ei, Auschwitzel, vá buscar …”

Çuma advogada negra muito negra Valéria Lúcia dos Santos mencionou seus filhos no meio de um discurso. “O mais velho tem 19 anos e o mais novo tem 17 anos. Eles continuam vivos apenas porque eu decidi tirá-los do Brasil. Hoje, os dois moram nos Estados Unidos, um país também extremamente racista e em guerra. Os negros estão lutando lá, gente! Eles estão lutando! Os negros dos Estados Unidos enviaram uma mensagem ao mundo: ‘Não sofreremos mais humilhação, não aceitaremos mais. Chega!’ “

Valéria dos Santos, moradora de Mesquite, Baixada Fluminense, é ex-esposa de um americano, “o pai dos meus filhos”. Ela não vê seus filhos pessoalmente desde 2011. “Eu deixei meu pai levá-los para a Flórida. Os meninos estudam lá, eles vivem melhor do que aqui. Eles não teriam futuro em Mesquita. O pai os está protegendo agora e já conversou seriamente com os dois: ‘Se a polícia chegue perto, fique quieto, não diga nada, não faça movimentos bruscos. França, Inglaterra, infelizmente … “

O advogado civil recebeu uma certa nota em setembro de 2018, quando teve uma discussão com um juiz leigo de Duque de Caxias, outra cidade da Baixada, durante uma audiência. Devido ao conflito, os policiais de plantão no fórum algemaram Valéria. Três vídeos gravando o evento circularam nas redes sociais e irritaram a Ordem dos Advogados do Brasil. “A juíza e a polícia cometeram um ato ilegal grave contra sua colega”, avaliou o Departamento de Administração do Estado. Visado pela representação da Ordem, o juiz foi demitido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

No final do discurso de domingo, Valéria disse: “Sinto muito pela mãe de João Pedro, porque sou a mesma mãe. Está revoltado! Quando gritamos, parecemos loucos. Não! Sentir. “

EM O protesto reuniu principalmente jovens entre 20 e 30 anos. Os negros, é claro, governavam, mas os brancos também compareciam, embora ninguém ousasse falar. Aleatoriamente, um casal andando por aí, ambos com pele muito clara, amaldiçoou os manifestantes. Alguns deles foram atrás dos autores. “Volte! Volte!”, Gritaram os outros. “Não aceitaremos provocações dos fascistas!” Embora inspirados pelos levantes dos Estados Unidos, os ativistas das Laranjeiras pregaram a paz. “Sem violência, pessoal!” O casal entrou ileso em um prédio próximo e sua calma se acalmou.

O primeiro-ministro acompanhou todo o ato de perto, sem mudanças, mesmo quando os slogans o citaram. A partir das 15h40 as manifestações se dispersaram. Logo depois, um grupo de palares chegou em frente ao palácio e a confusão chegou. A polícia diz que algumas pessoas atrasadas jogaram pedras na sede do governo e tentaram invadir a área. Para afastá-los, a corporação usou “instrumentos potenciais menos ofensivos”, como eles dizem: bombas de gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha. Não houve relatos de feridos.

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